Porque não há esperança
maior que a de ter outra noite ao teu lado, gostaria que o tempo
passasse, ao te encontrar, assim devagar, como é pra mim depois de
você partir. E que meu tempo fosse remotamente semelhante àquele da
presença, voador e transbordante. Ar e água. Ascendente, melodioso,
penetrante, expansivo, crepitante. E que eu fosse remotamente tão
sensata quanto você é, e com um pingo de razão pra me impedir de
dizer estas coisas valentes. Valentes, como eu derramada de sorriso
quando tem entre nós aquele quarteto de cordas: teus olhos, meus
olhos; tua boca, minha paz, e uma dose sobeja de coisas lindas por
dizer. E que eu não sonhasse com plantas de casa de madeira onde pôr
você dentro, aconchegado numas almofadas, metido a ler. E eu sempre
nua, metáfora desvelada, de passo leve, esgueirando pelo espaço,
contando detalhes, absorvendo, como que para não esquecer, para não
deixar o nosso canto, ecoando na minha lucidez. Porque meu amor
permanece inalterado. Senão mais profundo. Mais inteiro, sazonado,
mais certo. Se os sentidos faltam ao redor, permanece um ponto de
gravidade. Porque eu quero te pedir pra sentar ao topo do mundo e me
contar o que sente. Isso é o que eu sinto por ti. Que pena da minha
juventude fora do tempo. Que pena da minha velhice inexigida. Medo de fechar os olhos e ver o que
sou, sentada ao topo da promessa de ausência, que me
ousa desmanchar, abrir caverna, cumprimentar trevas. Que pena dos
meus votos. Como se não fosse serva do tempo. Como se tudo não
fosse até amanhã. Como se eu fosse morrer sem antes ouvir de novo
você dizer que me ama. Como se eu me mimasse inteira dessa luz
incomparável. E quisesse mesmo morrer do coração, para não
admitir que ele batesse menos do que agora. Menos do que contigo.