Releitura de Vinicius de Moraes
Porque você é só um rostinho bonito, e porque me lê para sentir-se querido, e porque eu escrevo para querê-lo, eu lhe prometo que a cada noite derramo nas estrelas um pouco do meu pudor. Porque você não se explica, fala pela metade, não tem consciência, flexiona os verbos, concorda com os artigos e preposições, não lê sinopses, e não gosta de nada, quero bem ouvi-lo dizer de novo que gosta de mim. Porque você tem também um ar recuado, mas quando chega me ocupa toda de ar morno, e se me toca me ocupa toda de ardente, eu lhe prometo até a importância que você já tem. Eu lhe prometo até tentar manter estas promessas no papel, porque você, se me ouvisse, insistiria em sacudir-me até eu não pensar em mais nada. Porque você é um homem simples e impossível, frugal e transbordante, antigo e jovial, sério e menino, e porque me deu uma rosa do jardim da igreja, e porque o gato que mora lá fica todo carente e oferecido para você, e eu simpatizo com ele porque me identifico, e porque você acerta meu gosto e fala o mínimo, porque você leva sempre um livro, e porque você quando começa a ficar carinhoso logo se contém, e porque na sua presença eu me defino por um raio máximo de dois metros de você. Porque, às vezes, quando começa a falar de coisas importantes, você esquece de me olhar e sabe bem que é porque eu começo a ver você, e logo pára, sabendo que eu tentava ser sua confidente. Porque a sua voz me acalma e o que você diz me aflige, e porque você canta que é uma doçura no meu ouvido, em quatro línguas distintas, eu lhe prometo quantas aventuras você quiser, e prometo não tentar desvendar todos os seus mistérios. Porque você me fala pelos silêncios, e eu lhe correspondo em gestos, prometo a você toda a minha sensibilidade, e a cada dia mais toda a minha força: é tudo que tenho para dar. Porque você é um luaceiro na noite, e porque tem nome de apóstolo e de poeta, e porque um dia vai desaparecer em alguma floresta num país distante, eu lhe prometo que, quando você for, não vou me perder, e só peço que, para deixá-lo, você não me diga adeus.